Saúde

Varíola dos macacos: resposta do governo brasileiro é insuficiente e repete erros da pandemia

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Comissão de epidemiologia da Abrasco alerta para riscos de descontrole ainda maior na propagação

A varíola dos macacos é uma doença viral, descoberta na década de 1970, causa lesões na pele e em casos mais graves pode levar à morte – AFP

Artigo publicado por um grupo de cientistas na Revista Brasileira de Epidemiologia alerta para lentidão e negligência do poder público no combate à varíola dos macacos em território nacional; cenário que repete a inação observada ao longo da pandemia da covid-19.

Assinado por especialistas que integram a Comissão de Epidemiologia da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), o texto aponta falta de estrutura laboratorial para testagem e diagnóstico rápidos, dificuldades de obtenção e divulgação de dados em tempo real e pouca ação para capacitar trabalhadores e trabalhadoras da saúde a atender pacientes com a doença. 

Desde que confirmou o primeiro caso de varíola dos macacos, no dia 9 de junho, o Brasil já tem mais de 1,3 mil pessoas contaminadas. Entre elas há pelo menos três crianças, fatia da população que mais têm chances de ter quadros graves. Nessa lista estão também grávidas e pacientes com imunidade comprometida. Além disso, o país registrou uma das oito mortes contabilizadas em todo o planeta por causa da doença até agora. 

O epidemiologista Jesem Orellana, um dos autores do artigo, alerta que a situação é preocupante. Segundo ele, que atua na Fiocruz Amazônia, o fato de o país ter o registro de um dos óbitos globais é simbólico e resultado da inação do governo federal. Ele pondera que, a falta de resposta do governo federal seria mais condizente com a realidade do início do século 20 “quando não tinha uma consolidação do conhecimento científico e as estratégias para enfrentar o problema ainda eram muito precárias e estavam em fase desenvolvimento”.

“Agora, não podemos ver o Brasil do século 21, uma das maiores economias do planeta, um dos maiores países do planeta, mais uma vez, repetir os erros que cometemos durante a pandemia da covid-19, com a monkeypox.”

O artigo publicado pela Abrasco lista uma série de medidas consideradas “urgentes e imprescindíveis”. A primeira delas é básica, a definição de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas na rede de atenção à saúde.

Em outras palavras, é preciso estabelecer uma maneira padrão de recebimento, acolhimento e atendimento de pacientes com a doença. Nem isso foi definido. Também falta um sistema com informações unificadas sobre novos casos e suspeitas, que traga detalhes clínicos, sociais e demográficos. 

Para conseguir uma resposta adequada, o texto menciona a necessidade de ampliação de recursos. As medidas contra a emergência da varíola dos macacos esbarram no desmonte estrutural do Sistema Único de Saúde.

Jessem Orellana lembra que, há cerca de um mês, a Secretária de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde desarticulou a sala de situação que tratava do tema. O espaço serviria para treinar técnicos e técnicas, orientar secretarias municipais e estaduais de saúde e abrir dialogo com cientistas.

“Tem um conceito que é fundamental para o enfrentamento de emergências de saúde, que é o conceito da oportunidade. Se você não atua de forma oportuna, de maneira a se antecipar, acaba caindo nessa situação evitável do espalhamento viral”, explica ele.

Outro problema enfrentado pelo Brasil é a centralização dos laboratórios de testagem, “Nós estamos treinando países e fazendo propaganda das ações do governo federal para o diagnóstico da monkeypox referência na América de Sul. No entanto, até hoje, o Brasil continua centralizando o diagnóstico em apenas quatro cidades de um total aproximado de 6 mil municípios que temos nesse país com dimensões continentais”, afirma Orellana.

Prevenção e cuidados

Causada por um vírus pertencente ao gênero ortopoxvírus da família poxviridae, a varíola dos macacos tem semelhanças com a varíola humana – que causou crises sanitárias no mundo todo por séculos, até que foi controlada pela vacinação na década de 1970.

A transmissão se dá a partir do contato próximo com fluidos corporais, gotículas respiratórias e materiais contaminados, como vestimentas, toalhas e roupas de cama. O período de incubação sem sintomas costuma durar de 6 a 13 dias, mas pode chegar até 21 dias.

Entre os sinais da doença são febre, dores no corpo e na cabeça, cansaço, gânglios inchados e lesões com feridas espalhadas pela pele. Os machucados causam dores e coceira e algumas manchas podem deixar cicatrizes.

Pacientes com a confirmação da doença devem se isolar e quem esteve com essas pessoas também precisa de monitoramento. Para prevenir o contágio é preciso evitar contato próximo, como beijos, abraços e relações sexuais e compartilhamento de itens pessoais.

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